sábado, 27 de junho de 2009

sobre as máquinas fotográficas que filmam

há algum tempo que estou para escrever sobre isto, máquinas fotográficas que filmam, fotógrafos que são pressionados a filmar.

ando nisto há muito pouco tempo mas desde que comecei que sinto que algo está para mudar. acho que entrei na fase de transição (querendo isso dizer não sei bem o quê ao certo). não vivi, infelizmente, o fotojornalismo duro, o a sério. na verdade, acredito que nunca irei saber o que isso é (ou foi). a altura em que cada foto era muito mais pensada, eram contadas, havia "x" rolos para gerir, um fotojornalista era um fotojornalista, ponto. comecei no tempo em que tudo parece mais fácil, é igual fazer 30 ou 300 fotos e quase toda a gente fotografa. talvez seja a democratização da fotografia a atingir o seu apogeu. isso assusta.

um jornal ou revista deixou de ser apenas isso e conta com mais que um suporte de comunicação. um jornal ou revista é também um site de informação, por exemplo. hoje em dia a fotografia não é apenas para ser publicada, a fotografia é também para o online, mas isso até é um pormenor. o online permite e pressiona para que seja mais que texto e fotografia. longe (muito longe) vão os tempos em que a rádio anunciava, a televisão mostrava e o jornal explicava. hoje em dia um jornal faz isso tudo. é imprescindível que assim seja. então como isso é ou pode ser feito? os órgãos de comunicação social já viram melhores dias em termos económicos mas por outro lado o trabalho é mais exigente e multidisciplinar. a solução? passa pelos profissionais se adaptarem a este novo mundo. um jornalista tende a ser cada vez mais multimédia. em termos práticos, um redactor ou um fotógrafo tem de filmar também. porquê? porque é necessário haver vídeo e não há dinheiro para contratar pessoas que apenas façam isso (isto muito resumidamente).

isso assusta. e assusta-me mesmo não tendo razão para isso, venho de um curso de audiovisual e multimédia. ao longo dos anos de faculdade percebi que o mercado estava a evoluir neste sentido daí a necessidade de haver um curso como o meu, por exemplo. sou desta nova geração multimédia. até acho que filmei mais do que fotografei enquanto estudava. mas quero especializar-me na fotografia. começo a cruzar-me com antigos colegas nos serviços, eles filmam, eu fotografo. eles não tiram fotografias, eu não filmo. até parece simples. eu acredito que nos podemos especializar numa área, mesmo tendo noções de outras. agora as máquinas fotográficas profissionais (ou semi-profissionais) já filmam. a médio prazo a tendência é para a fotografia ser um frame do vídeo e não adianta justificar muito isso. é óbvio. não é possível fotografar e filmar ao mesmo tempo. tendo o indivíduo filmado, é só escolher a melhor expressão. isto parece-me muito, mas muito, grave. onde fica o fotógrafo no meio disto tudo? onde fica a essência do seu trabalho? recolher aquele momento (decisivo) deixa de fazer qualquer sentido. (estou a ser demasiado pessimista, espero que não cheguemos a este ponto mas para lá caminhamos, acreditem).

podem perguntar-me "então porque não estudaste apenas fotografia?" por "n" motivos que não adianta enumerar aqui. gostei do curso, gosto de ter noções de mais áreas, abriu os horizontes e ajuda-me no dia-a-dia. tenho noções de web que me permitem, por exemplo, ter o meu site e actualizá-lo, o que não faz de mim nenhuma profissional nessa área como outros colegas que se especializaram nisso. não acredito que qualquer um de nós consiga ser realmente bom em mais do que uma área (ou talvez duas) mas a minha preocupação é que o mercado não procure a qualidade mas sim aqueles que consigam fazer mais do que uma coisa. já deixei claro que isso me assusta?



[acredito que isto passe completamente ao lado de quem não está por dentro do meio, de quem é apenas consumidor e "exige" uma resposta das novas funcionalidades da informação. mas queria que pensassem um pouco sobre isto pelo nosso ângulo.]

7 comentários:

Alexandre disse...

eu, consumidor, assusto-me com isso e contigo.

mas, eu, consumidor, não darei dinheiro a ganhar a projectos de má qualidade. o mal é que todos os que gerem ocs tendem a nivelar para baixo e não para cima - depois admiram-se de perder leitores...

ergela disse...

É normal, eu começei como tu e acabei a tentar colaborar com o Jorge Pelicano aquele que fez o documentário "Ainda há Pastores".
Não há nada como tentar fazer um pouco de tudo, dá-nos mais "andamento" precebes.

Nota: Devo dizer que estou zangado com a minha amiga, ainda não nem uma vez que seja à minha casinha, não é justo.

:) beijo.

teresa disse...

sara:
partilho o teu medo, porque acho que muito facilmente se cede ao "domínio" do vídeo. é uma área com que trabalho todos os dias e, atenção, não tenho nada contra o vídeo. só não quero é vê-lo banalizado e a substituir as outras áreas.

acho que tem sido dada demasiada importância ao vídeo em si, em vez de o relativizar, colocá-lo ao mesmo nível de outros meios.

saber aproveitar o vídeo, mas também não esquecer o papel que a fotografia tem, o texto, o som. em multimédia cada um destes meios tem a sua mais valia e todos são importantes.

pelo menos é assim que eu penso :)

Pedro disse...

um post muito pertinente
para pensar e voltar

silvia disse...

A televisão (e depois a internet) mataria os jornais, o kindle matará os livros... não acredito em nada disso.Assim como não acredito que o fotojornalismo seja absorvido pelas possibilidades que o vídeo traz. Frames incontáveis não significam a multiplicação de potenciais boas fotografias.

Haverá sempre lugar para as diferentes formas de expressão, desde que estas saibam reinventar-se e assegurar o seu lugar.

Ninguém me convence de que a fotografia e o fotógrafo, que consegue congelar emoções e acontecimentos, sejam substituíveis.

Pedro disse...

Em rigor um vídeo é gerado com:
- velocidade de obturação fixa, só com controlo da luz pelo diafragma;
- as imagens têm uma resolução fixa que, em dpi, é relativamente baixa, mesmo na dita HD a 1920x1080;
- a taxa de compressão vai de elevada a muito elevada (para não falar da compressão intra e interframe que só piora o problema);
- acresce que uma máquina fotográfica que faça vídeo tem o problema do handling, os vídeos ficam na sua maior parte tremidos.

Como consequência:
- a qualidade das “fotografias” geradas é de sofrível a muito má qualidade;
- as imagens úteis finais geradas são inferiores aos 25 ou 30 frames por segundo que captam porque:
-- como têm uma velocidade de exposição relativamente baixa, e
-- porque o corpo/peso não facilita o handling e se treme mais do que o normal,
-- grande partes das 25 ou 30 imagens de cada segundo estão tremidas;
- mesmo imagens nítidas só são usáveis em circunstâncias onde se apliquem 72 dpi ou talvez no máximo 150 dpi e já é abusar da “sorte”.

O simples facto de a velocidade de obturação ser fixa já faz destas imagens casos muito particulares: a regulação criativa e com carácter informativo da profundidade de campo, do movimento registado em blur ou congelamento da acção, torna-se difícil ou impossível. O tipo de imagem gerado (não lhe consigo chamar fotografia), só por isto, fica “estreitado” a um certo tipo de registo muito imediatista e eventualmente superficial.

É um facto que quem decide, quem tem o poder de gestão nos media, só vê o imediato e regula-se pelos custos económicos e financeiros. É um facto que em Web os 72 dpi chegam e sobram. Mas, até ver:
- uma máquina fotográfica ainda não faz bons vídeos e uma sucessão a 25 ou 30 fps não são fotografias;
- uma máquina de vídeo ainda não faz boas fotografias;
- a pressão para que as áreas se misturem vai aumentar;
- os fabricantes de equipamento querem é vender material e criam nichos:
-- as só fotográficas
-- as só de vídeo
-- as misturadas
Todas elas com cada vez mais features e gadgets que, na maior parte das vezes não servem para nada, só servem de marketing para atrair a atenção e para fazer com que o responsável financeiro/patrão da empresa leia as especificações, não perceba o que lê mas fique com a impressão que percebe, e diga do alto da sua ignorância que “aquela máquina faz isto e aquilo”, com o isto e o aquilo a serem o que lhes resolve o problema por menos dinheiro.

Seja em fotografia, seja em vídeo/filme (digital), (provavelmente vai deixar de se chamar vídeo, o vídeo tenderá a morrer como o conhecemos), as únicas máquinas verdadeiramente úteis do ponto de vista profissional são as que:
- são pesadas, o peso dá estabilidade física, e isto é importantíssimo para qq tipo de take, foto ou filme;
- têm as funcionalidades acessíveis por botões de forma directa e não por menus: isto implica espaço físico disponível no corpo do equipamento, ptt volumetria;

Pedro disse...

O resto? Paisagem. Mas é verdade que esta luta vai continuar. E quando quem decide é ignorante ou, pior, acha que sabe sendo na realidade ignorante, a luta entre o profissional que quer fazer um bom trabalho e o contratante que quer pagar o mais barato possível, esta luta continuará renhida.

Já tive um cliente a pedir-me para fazer, ao mesmo tempo, um jogo para computador (ptt todas as imagens a 72 dpi) e que ao mesmo tempo pedia que as imagens do jogo servissem para a parte gráfica de ilustração de um livro... E as imagens, na sua maioria, eram originais raster a 72 dpi, boas para aplicação directa no jogo, impossíveis de usar no livro sob pena de aparecerem todas pixilizadas... E explicar-lhe isto? E que ele acreditasse em mim? Sei que nunca ficou convencido. O jogo foi feito, o liivro não (ou era um outro projecto com outro orçamento, e isso ele não queria!) e obviamente perdi o cliente...

Mas estamos num mundo onde, hoje, ver vídeos do youtube com péssima qualidade em emissões Tv broadcast, tudo pixilizado e a 10 fps (ptt com IMENSA qualidade de reprodução de movimento, estou a ser imensamente sarcástico, obvimante) já é considerado “normal” (entre aspas porque me arrepia isto...). Donde, um dia desses, talvez passe a ser considerado normal publicar livros onde as imagens pixilizadas são a “norma”. Que já há livros que não são mais do que printscreen dumps, isso há, onde, de página para página, de capítulo para capítulo (quando os têm!), o grafismo e layout vão variando ao sabor não se sabe de quê... Mas a isso eu não chamo livros, chamo lixo, para ser politicamente correcto...